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Chanfana: A arte de fazer deliciosa uma cabra velha e feia

A vida era difícil e tinha de se aproveitar tudo o que vagamente ainda contivesse algum valor nutritivo. Nem que fosse uma cabra velha, gasta de anos e anos de ordenha até não produzir mais gota de leite. Nasceu a Chanfana!

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Com “cabra velha e feia”, as mulheres da Beira conseguiram a Chanfana: um dos mais deliciosos pratos da cozinha portuguesa. Depois de anos e anos a sugar-lhe o leite, o fim da cabra havia de chegar em glória de cozedura lenta em vinho tinto. Resultado divinal!

É um dos ex-libris da cozinha portuguesa, hino à arte e imaginação das mulheres para inventar o sustento das famílias quando quase nada havia para comer!!!

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Ribeira do Coentral – Serra da Lousã | De: Pedro Guerra Photography | Clicar na imagem para ver original |

Tinha de se aproveitar tudo que vagamente ainda contivesse algum valor nutritivo. Nem que fosse uma cabra velha, gasta de anos e anos de ordenha até não produzir mais gota de leite.
Porque, enquanto jovem, a cabra seria útil para dar leite, procriar e manter as terras férteis e limpas.
Depois de tanto leite produzir, ainda acabava aos pedaços dentro de uma caçoila para cozedura lenta em vinho tinto. Umas quatro horas ao lume…

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As batatas, os grelos e a chanfana de Vila Nova da Poiares.

Dizia a receita passada de boca em boca ao longo de gerações:
“Pega-se numa cabra velha e feia…” Ou seja, mesmo a cair da tripeça!
A arte da gastronomia está aqui: Como se transforma coisa praticamente incomestível num dos mais deliciosos pratos da cozinha portuguesa? Exercício culinário só comparável, em termos de aproveitamento de tão pobres ingredientes, aos segredos de transformar pão duro de duas semanas numa excelsa açorda alentejana.

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Cabreira – Concelho de Góis | De: José Branco Carvalho | Clicar na imagem para ver original |

Prato típico da Beira Interior e Litoral, a Chanfana, era confeccionada em caçoilas de barro negro produzidas na região.
No concelho de Góis, esta iguaria toma o nome de fusca. Mas por toda a beira era conhecida como Carne de Matrimónio, nunca faltando em todos os casamentos. E quanto melhor fosse a qualidade do vinho tinto, mais saborosa ficaria a chanfana.
Vila Nova de Poiares, Miranda do Corvo, Lousã e Penacova têm sido os concelhos mais activos na divulgação deste prato emblemático da nossa cozinha tradicional

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Aldeia de Xisto do Gondramaz – Miranda do Corvo | De: Rui Pedro Guerra | Clicar na imagem para ver original |

Nada se perdia. Se depois de velha a carne da cabra era aproveitada para a chanfana, os restos eram utilizados para fazer sopa e as vísceras utilizadas para confecionar negalhos, outra receita característica da região, que não deve ser confundida com a dos maranhos.
No caso do negalhos, o bucho e as tripas são lavados e deixados durante algumas horas com limão e sal e depois temperados com sal, colorau e piripíri. Dentro de cada bocado de bucho colocam-se pedaços de tripas e de toucinho e uma folha de hortelã, fazendo se uma “bola” que se cose com linha. Cobrem-se posteriormente os negalhos com vinho tinto e assam-se num forno a lenha.

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Portela de Oliveira, Penacova | De: Maria Rodrigues | Clicar na imagem para ver original |

Esta Chanfana é mais um argumento de peso para obrigar a visitar uma região já de si lindíssima onde as serras alternam com vales de águas fartas e cristalinas. E sempre o deslumbramento da descoberta das aldeias de xisto.
Ou, como nós dizemos, para lá das montanhas, vidas de xisto e sabores de passeio!

Estava a pensar que esquecíamos a receita???

E como não queremos que lhe falte mesmo nada, ainda lhe trazemos uma outra visão da confecção deste prato com o Chefe Hélio Loureiro e a Nutricionista Patrícia Padrão.
Vá assistindo, enquanto nós vamos ali ao lado deliciar-nos com uma Chanfana!!!

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